Judicialização da Saúde dispara: o que está por trás do aumento de mais de 500% nas ações?
- Rodrigo Carvalho
- há 14 horas
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O número de ações judiciais envolvendo questões de saúde no Brasil alcançou um patamar recorde em 2024. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram mais de 250 mil novos processos — um aumento superior a 500% em relação aos anos anteriores. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, classificou a judicialização da saúde como um dos maiores problemas enfrentados atualmente pelo Poder Judiciário.
Para a advogada Carla Simas, especialista em Direito da Saúde, o fenômeno é reflexo direto das deficiências estruturais do sistema:
“A falta de acesso oportuno a tratamentos, medicamentos e procedimentos — tanto na rede pública quanto na saúde suplementar — empurra o cidadão para o Judiciário como única alternativa para garantir seus direitos”, explica.
De um lado, pacientes buscam na Justiça medicamentos de alto custo, exames especializados e cirurgias. De outro, o Estado e as operadoras de planos de saúde alegam dificuldades para atender à crescente demanda, especialmente diante da evolução acelerada das tecnologias médicas.
Consumidor mais atento pós-pandemia
Um fator que também ajuda a explicar essa explosão de processos é a mudança de comportamento do consumidor após a pandemia. O paciente está hoje muito mais atento à própria saúde, busca com mais frequência tratamentos e diagnósticos e conhece melhor os seus direitos.
“Temos, de um lado, a recusa frequente dos planos de saúde e, do outro, um paciente-consumidor muito mais consciente, que acompanha de perto sua saúde, exige qualidade no atendimento e identifica com mais facilidade falhas no sistema — inclusive erros médicos e diagnósticos equivocados, que também cresceram significativamente nos últimos anos”, avalia Carla Simas. “Esse cenário impulsiona ainda mais a judicialização como meio de reparação e garantia de direitos.”
Tendência de alta em 2025
As perspectivas para este ano indicam que o problema deve se agravar. Projeções internas do CNJ apontam que, em 2025, o número de processos envolvendo saúde poderá ultrapassar 300 mil novas ações, considerando a tendência de envelhecimento da população e o aumento da complexidade dos tratamentos médicos.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) também alerta que, com a população idosa crescendo rapidamente — o grupo acima de 60 anos deve representar 18% dos brasileiros até o final de 2025 —, a demanda por serviços de saúde mais especializados e de alto custo tende a explodir, pressionando ainda mais os sistemas público e privado.
“Se nada for feito para melhorar a gestão da saúde e a fiscalização das operadoras, o ciclo de judicialização só vai se intensificar”, reforça Carla Simas. “É urgente que se criem políticas públicas eficazes de incorporação de novas tecnologias e que a regulação da saúde suplementar seja fortalecida.”
Medidas emergenciais
Na tentativa de conter a escalada, o CNJ tem promovido iniciativas como a Semana Nacional da Saúde — dedicada à resolução extrajudicial de conflitos — e criou o Prêmio Justiça e Saúde, para incentivar práticas inovadoras que reduzam a litigiosidade.
Em 2024, a ANS e o CNJ firmaram um novo acordo de cooperação para fortalecer o apoio técnico aos magistrados, fornecendo informações atualizadas sobre evidências científicas e protocolos médicos, a fim de embasar decisões judiciais mais equilibradas.
Ainda assim, para Carla Simas, essas medidas, embora necessárias, não são suficientes:
“A judicialização não é a causa, é a consequência. Enquanto o acesso à saúde for precário e os contratos de planos forem desrespeitados, as ações judiciais seguirão sendo a principal ferramenta para garantir o direito à saúde no Brasil”, conclui.
Com uma tendência de crescimento contínuo e impactos financeiros bilionários para o Estado e para as operadoras, a judicialização da saúde deve seguir como tema central na agenda pública de 2025 — exigindo soluções que transcendam o Judiciário.